19 janeiro 2013

Jogar à "mama"


Embora a dupla Cardozo e Lima já contabiliza mais de 40 golos esta temporada pelo Benfica, a verdade é que frente ao Porto deixou muito a desejar. Este artigo visa debater as melhorias que devem ser feitas e as necessidades que a equipa encarnada necessita.


Cardozo e Lima, os goleadores da época
passada, têm marcado pelo Benfica, mas
poderiam fazer mais e melhor. No clássico
foi notório a necessidade de melhorias.
Em termos globais estou contente com as prestações dos dois principais goleadores do campeonato nacional da época passada. Têm marcado regularmente e isso é sempre muito positivo. Contudo, se é verdade que frente a equipas inferiores ambos têm tido prestações muito boas, já frente a equipas mais organizadas e de nível, as coisas mudam de figura. E, como a exigência num clube como o Benfica é sempre a maior, devemos sempre procurar melhorar, daí que tenha de fazer esta crítica.

No passado domingo, senti um pouco defraudado com o trabalho tanto de Cardozo como de Lima, na frente de ataque encarnada. Basicamente, Mangala e Otamendi, com a ajuda de Fernando e dos laterais Danilo e Alex Sandro, conseguiram anular a nossa dupla atacante quase por completo. É certo que muitas vezes anularam recorrendo a "manhas" à margem da lei, devidamente aproveitados e em sintonia com o "critério largo" do árbitro. No entanto, é face a este tipo de adversidades que vemos quem tem aquela capacidade extra. Ora, por não ter visto isso em Cardozo e Lima é que fiquei desiludido e algo preocupado.

Quando se joga à mama é fácil ser-se antecipado...
Frente ao Porto ou a outro adversário, o comportamento dos nossos avançados é sempre o mesmo. Posicionalmente, jogam em cunha com os centrais adversários e esperam que o nosso meio-campo e laterais construam os lances para a dupla finalizar. Na gíria futebolística, chama-se a isso jogar à mama. De volta e meia, vemos um deles (sobretudo o Lima) descer para entre linhas ou a cair numa das faixas, ajudando na fase de construção de jogo ofensivo. Ora, este posicionamento e movimentações é muito pouco para baralhar marcações frente a defesas bem organizadas.

A dupla jogando entre linhas, não só fica mais
próxima dos colegas, como criam espaços ao
arrastar a defesa adversária, e confunde a tarefa
aos médios defensivos adversários.
O que fazer então? É preciso que tanto Cardozo como Lima saibam sair da zona dos centrais adversários e que tentem ocupar mais o espaço entre-linhas. Em primeiro lugar, este posicionamento faz com que os nossos avançados fiquem numa zona cinzenta no que às marcações adversárias dizem respeito. Por um lado, os centrais adversários terão que subir no terreno se quiserem marcar a dupla atacante, saindo da sua zona de conforto, por outro lado, como a maioria das equipas usa um médio defensivo, este ficará confuso sobre qual dos dois avançados marcar primeiro. Ora este posicionamento agitará a "entropia" naquela região, originando erros de marcação, de comunicação e acima de tudo um desgaste físico e mental aos jogadores adversários naquela região. Muito provavelmente, o treinador adversário vai pedir para que ou um dos laterais ou um dos outros médios da equipa ajude nas tarefas defensivas, restringindo assim a libertação de mais unidades para o ataque. Logo, beneficiando a equipa encarnada em termos defensivos. Mas, se a nossa dupla atrair mais gente para aquela zona do terreno, mais espaços se abrirão, não só nas faixas, como por detrás da defesa adversária, na qual os extremos, os laterais e até um dos médios-centro encarnados poderão aproveitar para penetrar.

Cardozo tem de melhorar o seu jogo de costas para a baliza.
É verdade que os centrais muitas vezes jogam à margem da
lei, mas o paraguaio tem de saber ultrapassar isso, com
mais empenho, mais trabalho e esperteza.
Contudo, só o novo posicionamento não resolve todos os problemas que tenho visto da dupla. O Tacuara precisa de ser mais produtivo no que respeita a ganhar bolas de cabeça aos defesas contrários. Precisa também de trabalhar mais do ponto de vista técnico e físico, para conseguir suster pressões de um e dois adversários, ao mesmo tempo que retém a posse de bola. Isto para além de depois saber passar com qualidade para o colega em seu auxílio. Ao longo dos últimos anos de Benfica, o Cardozo foi sempre um finalizador, pois teve sempre um Saviola e um Aimar que lhe faziam a "papinha toda". Hoje tem um Lima, que não é a mesma coisa e em vários pontos até compete, de forma distinta, com o paraguaio. É por isso fundamental, que o camisola 7 saiba adaptar-se a outro estilo de futebol.

Procurando outras posições acaba por confundir marcações
e assim criar espaços para combinar com colegas.
Não obstante, o brasileiro sendo um goleador oportunista, também tem de se adaptar às necessidades do Benfica e do seu companheiro de equipa. Dificilmente, Lima será um Saviola ou Aimar para o Tacuara, pois tem características distintas e também ele está formatado para ser a referência goleadora das suas equipas, embora por processos de jogo distintos. Mas, isso não invalida que ele possa aprender e adaptar o seu jogo ao jogo do Cardozo. A mobilidade dele e o seu oportunismo podem ser um excelente complemento se trabalhar em conjunto com o Cardozo. Frente à Académica, fez-me uma certa confusão o seguinte: o Lima ganhou a maioria das bolas de cabeça aos centrais adversários, na qual era o Cardozo quem beneficiava desse tipo de jogada. Não deveria ser o contrário? Aliás, a chapelada do brasileiro no terceiro golo da noite é uma boa prova de como deve ser! Pena ter sido quase um caso isolado durante todo o encontro...

Lima precisa de melhorar a protecção de bola e o seu jogo
de costas para a baliza. Para além disso precisa de aumentar
a sua agressividade defensiva, um pouco à imagem de
Luis Suárez do Liverpool.
Se o Cardozo tem de participar mais na fase de construção, o Lima que tem sido o mais chamado a essas funções tem de trabalhar mais e melhor nesse aspecto. Frente ao Porto, frente a dois jogadores adversários, não soube ter manha e técnica suficiente para levar mais vezes a melhor sobre eles. Há uma clara necessidade de ambos os pontas-de-lança adaptarem-se às reais necessidades da equipa nesta estratégia e esquema táctico.

Um dos movimentos que deve ser treinado é
a saída de bola pelo guarda-redes através de um
passe longo para o Cardozo. Este tem de sair da
sua posição, procurando ir para uma faixa.
Assim confunde a marcação do lateral ao nosso
extremo e atrai não só a sua marcação pessoal
do central como também a do médio-defensivo,
criando espaços onde o nosso extremo e o Lima
possam surgir para dar continuidade à jogada.
Lance de futebol directo puro, mas que exige
muito do jogo aéreo do Cardozo.
Nota: quanto
mais a defesa adversária estiver avançada no
terreno, melhor probabilidade de sucesso tem
este tipo de jogada, isto se o avançado se
superiorizar no jogo aéreo.


Por outro lado, tem de haver um grande investimento por parte da equipa técnica para treinar o posicionamento e as jogadas da dupla e dos jogadores mais próximos deles, como são os extremos e os médios. Por exemplo, frente a um Porto, foi notória a falta de dinâmica da dupla e do resto do meio-campo. Pareciam dois blocos distintos, quando deveriam basicamente comportar-se como um só. No fundo, não se trata apenas de melhorar o entrosamento da dupla, mas sim toda a simbiose que pode existir entre ela e o resto da equipa.

É verdade que tenho visto melhorias. Aliás, a segunda parte do Sporting a dupla jogou como eu pretendia e foi graças a essa nova dinâmica que o Benfica conseguiu virar o resultado. Também é certo que procuraram fazer, muito timidamente, frente ao Porto, mas é preciso muito mais trabalho individual e colectivo com a dupla atacante.

Noutra prespectiva, penso que se Jorge Jesus não quiser ter muito trabalho, muito provavelmente terá que desfazer esta dupla para alguns jogos... Nesse caso, qual seria a melhor alternativa? E, quem da dupla é que deveria sair? Cardozo ou Lima?

Uma nota final: se Cardozo e Lima têm marcado todos estes golos jogando de forma algo passiva, imaginem o quanto eles não marcariam se melhorassem os aspectos mencionados?



PS: Já votaram para a eleição do melhor jogador encarnado em 2012 para a posição 8, a de médio-centro mais ofensivo?

5 comentários:

  1. pela 2ª vez, digo:
    isto é um blog a sério, bom trabalho.
    parabéns.

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    1. Obrigado pelo elogio. Se tivesse mais tempo até fazia uns gifs para demonstrar a evolução dos movimentos que pretendia que fizessem.

      Já agora, deixei umas questões no final. Não queres dar a tua opinião?

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  2. Grande artigo parabéns!!
    Eu concordo com o treino dos avançados, aliás houve um goleador que tinha também a mesma opinião, Cadete, ele defende que os avançados deveriam ter treinadores só para eles como têem os guarda redes!
    Não concordo sobre a movimentação de Lima e Cardozo no sistema atual sem Aimar e com os extremos abertos é quase um suicídio fazê-lo com equipas como o FCP, no teu primeiro esquema mostra que pode ser fácil anular tais movimentações sobretudo porque existe uma maior facilidade de marcação por parte do adversário que faz com que sobre sempre um defesa adversário para se portar como um Líbero! Lima está a fazer muito bem o seu papel é o elo de ligação técnica com o meio campo e com o ponta de lança (Cardozo), o papel de Cardozo é precisamente o espaço entre centrais para confundir quem marca fazendo movimentos pouco distantes entre um e outro precisamente para levar consigo os 2 centrais ou pelo menos apróximando-os um do outro, aí entra o "vadio" Lima com liberdade para no espaço entre meio campo e ponta de lança fazer o que o jogo proporciona.
    No Benfica com Aimar, Ramires, Javi e Di Maria o logango era poderoso no ataque foi assim na primeira época e JJ teve o mérito de o fazer funcionar ás mil maravilhas, pois Ramires era o segundo trinco do Benfica bem como na chegada de Witsel fazendo igualmente o mesmo losango necessário para equilibrar a equipa nas transições defensivas e atacantes!
    Quanto a Cardozo, eu não sou muito admirador porém é o que temos e melhor é impossivél! O Cardozo a mim deixa-me um pouco desiludido ao nivel técnico é como dizes poderia aprender mais na maneira como aborda os lances aéreos a a cobertura de bola, precisa acima de tudo querer, é que antes de renovar, isto é, á uns três quatro jogos atrás fazia três por jogo e realmente era esforçado e a sua entrega ao jogo era outra!Mas isso é a minha opinião...poderá ser coincidência!
    Na parte final do teu esquema concordo com o que dizes deve haver mais próxmidade entre jogadores, tenho reparado nos jogos precisamente o contrário existe um distanciamento claro muito por culpa de JJ que prende muito uma equipa á estratégia! Quanto ao lance longo de Artur não concordo nunca deve ser assim iniciar, a probabilidade de se ganhar um lance como esse é reduzido não desfazendo também de outros aspetos técnico/táticos!
    Por fim a dupla que tentaria colmatar sem Lima e Cardozo! O Lima sozinho lá na frente, creio que ele tem a esperteza e olho para advinhar os lances! Juntamente com Rodrigo atrás...lol
    Podias falar um pouco da defesa, gostava de saber a tua opinião sobre isso!
    Abraço

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    1. Bem Pedro S.,

      Como é que devo começar... tu tocaste em alguns pontos de discussão que gosto... vamos lá tentar contra-argumentar ponto a ponto...

      1 - Tens toda a razão relativamente aos extremos abertos. Contudo, e porque Nico e Salvio têm "adn" de avançados, percebem que não poderão ficar sempre agarrados à linha. A figura não dá para ver (por isso é que gostava de ter apresentado um gif com os vários momentos dos movimentos), mas o que pretendia naquela primeira figura era demonstrar que se a dupla ficasse entre-linhas, isso faria com que a tal dupla de centrais subisse, e o médio-defensivo adversário ficasse indeciso sobre quem iria marcar quem. Muito provavelmente, o treinador adversário mandaria outro médio, libertando um pouco a pressão sobre o nosso meio-campo e defesa. Por outro lado, nas costas da defesa adversária, iria haver espaço para a bola num extremo que fizesse uma diagonal... e estou mesmo a ver o Salvio e o Nico a chamarem-lhe um figo ao passe.
      Neste caso o líbero teria que ser o guarda-redes adversário, mas este teria que ser muito rápido. De qualquer maneira, a dupla serviria de engodo para libertar a pressão sobre outros sectores.

      Se eles tiverem em cunha com os centrais, ou mesmo que um deles esteja à frente e outro atrás, ambos terão que ganhar os seus duelos individuais. Desta forma como descrevi, a proximidade dos jogadores permite ganhar segundas bolas ou até mesmo faltas quando os centrais tentarem defender.

      2 - O Lima a meu ver faz bem esse papel frente a equipas de menor nomeada. Mas, quando tem pela frente um Fernando, ou um Busquets, ou um Song, ou um Javi Garcia, vai ser anulado, pois estes têm um posicionamento melhor e estão integrados numa estratégia sectorial melhor que a actual do Benfica. Lima é forte quando está de frente para a baliza com a bola controlada, podendo explodir com um drible/finta. Mas, na maioria das vezes apanha a bola ou de costas, ou de lado, e logo de seguida esbarra no médio-defensivo, ou no "8", ou no central de marcação adversário. Nem dá tempo para rodar. Vi isso acontecer "n" vezes frente ao Porto.

      Ora, porque não ser o Cardozo, fisicamente mais robusto a parar e tabelar com um médio-centro ou ala? Não digo sempre, mas irem revezando-se em quem faz a ligação. É que Cardozo, pode ganhar em termos físicos à maioria dos médio-defensivos no nosso campeonato. Enquanto isso, o Lima numa diagonal curta, pode atacar o espaço que é criado pela subida do central cuja missão é marcar o Cardozo. É aproveitar este atraso da marcação que Cardozo pode dar para o médio-ofensivo e este por sua vez de primeira e em lob dá para a desmarcação do rapidíssimo Lima.

      Nós temos é de obrigar o adversário fazer o nosso jogo, essa é a primeira regra. E, uma das melhores formas de fazê-lo é fazer o melhor jogo do nosso jogador, sobre o jogador adversário que pior sabe fazer esse jogo. Lol! A ver se me explico melhor... Se eu mandar uma bola aérea para perto de um jogador pequeno adversário, e fazer disputá-la com um jogador enorme da minha equipa, a probabilidade de ficar com a bola é enorme. Da mesma forma que se eu mandar uma bola pelo chão, para o espaço vazio para um jogador meu rapidíssimo, entre dois centrais adversários lentos, também tenho vantagem.

      Agora, se mandar uma bola alta para um avançado grande e lento entre dois centrais altos e lentos, então... em cada 10 bolas, talvez duas ou três eu consiga ganhar... se o meu avançado chamar-se Drogba, consigo melhor índices... mas, quantos Drogbas existem no mundo?

      (... Continua)

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    2. (... Continuação)

      3 - Esse Benfica do Aimar, Ramires, Di Maria, Saviola é bem diferente deste. Logo à partida, havia aquela química entre o Aimar e o Saviola que fazia com cada estragos... é algo que é muito raro conseguires ter no futebol profissional, pois eram dois jogadores que já se conheciam à muito...

      4 - A questão do lance do Artur, é apenas mais um tipo de saída ou de resposta a uma pressão intensa do adversário. Na pior das hipóteses, o teu ponta-de-lança consegue cabecear, mas a bola acaba num defesa adversário. De qualquer das formas, tiveste tempo para subir a tua equipa e a partir daí é o adversário que se sente pressionado.

      Acabas por esticar o jogo e fazê-los correr como uma bola que tem de percorrer o campo até à linha de fundo. Isso faz desgastar fisicamente a equipa adversária, e por conseguinte aumentará os espaços intersticiais com o aliviar das marcações.

      Não quero com isso que saiamos para o ataque sempre assim. Longe disso. Há muitas mais jogadas que se pode fazer. Esta foi apenas uma que lembrei-me ao ver o Benfica - Porto.

      De qualquer forma, o Cardozo tem de ganhar as bolas de cabeça e antes disso, os passes de Artur têm de ser precisos, algo que nesse encontro não aconteceu.

      5 - Lima e Rodrigo... gosto, mas gosto mais quando tenho falsos extremos como Nolito (ou Ola John) à esquerda e Nico (ou Bruno César) à direita. É que assim estes ao fazerem movimentos interiores, vão trazer consigo os laterais, abrindo espaços nas alas, onde Lima e Rodrigo podem aparecer, ou então Maxi e Melga podem subir.

      Quanto à nossa defesa, eu acho que está bem e recomenda-se. Acho que é algo que o Jesus tem trabalhado, mais até que o ataque. Já não sofremos tantos golos de transições defensivas como no início da temporada. Quanto aos lances de bola parada, é apenas aumentar os índices de concentração. Fisicamente a nossa equipa impõe a qualquer uma a nível nacional. Escrito isto não significa que tenha as minhas preferências... a ver se escrevo sobre isso com mais tempo.

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