Sem cabeça...

... e sem plano.

Assim poderia resumir o jogo do Benfica ontem no estádio do Algarve e que nos deixou a morrer literalmente na praia, pois ficámos a uma vitória do acesso à final e à possibilidade de sermos realmente campeões de inverno, conforme o slogan publicitário da Taça da Liga CTT o diz. E, não foi por falta de aviso que não vencemos o Moreirense comandados por um anti-Benfiquista primário como o Augusto Inácio.

Sem comunicação mobilizadora

Começo a minha análise crítica ainda antes do jogo começar. Na conferência de imprensa que antecedeu esta meia-final, Rui Vitória, que até fez a sua conferência após o seu homólogo do Moreirense, deveria ter incendiado o jogo. E, porquê? Por três grandes motivos. O primeiro, porque Augusto Inácio, que fora nos primeiros 6 meses da temporada uma das vozes mais críticas do Benfica, retirando o mérito das vitórias aos jogadores e à equipa técnica e entregando-os às arbitragens. Segundo, porque o treinador do Moreirense, basicamente tinha desprezado o confronto com o Benfica, ao dizer que iria jogar com os suplentes. E, terceiro, porque havia tentativa de colagem do Moreirense como uma espécie de Sporting C ou D. Nada melhor, que o treinador do Benfica ter incendiado e terminado com um "não podemos ser Inácios!" no final dessa conferência de imprensa. Isto teria um efeito positivo sobre o grupo de trabalho. Um efeito de maior foco e de provar ao adversário que quem domina o jogo verdadeiramente. Percebo que se tenha optado por outra estratégia. No entanto, por vezes, não podemos fugir à luta. E, esta era uma luta que teria um gosto especial de defrontá-la. Assim, a atitude dos jogadores menos utilizados seria outra. Muito mais competitiva desde o primeiro minuto até ao último. E, tal não aconteceu. Este é para mim, o primeiro sinal de não termos um verdadeiro plano. Já agora, fui o único a sentir um apoio frio dos adeptos no sul do país? Será que aquecendo um pouco o ambiente antes do jogo, não teria sido diferente até o apoio vindo das bancadas... não?

Sem plano de jogo

Mas, pior do que esta vertente comunicacional, é a inexistência de um plano de jogo consolidado. E, isso vê-se na forma como jogámos. O nosso futebol não foi fluido e viveu demasiado da inspiração individual dos jogadores. Em termos posicionais, havia claras lacunas. Três grandes exemplos, são: o posicionamento de Jonas, o do Carrillo e o de Jardel. Se queremos ser uma equipa de posse de bola e que consiga controlar os ritmos de jogo (acelerando e desacelerando quando é necessário), é preciso que estes três jogadores formem com a dupla de meio-campistas Samaris e Pizzi um quinteto compacto e coeso. Começando pelo avançado brasileiro, este até poderia jogar a passo, como faz muitas vezes o Messi no Barcelona. Contudo, em vez de estar em cunha com os centrais, deveria fixar-se mais vezes entre-linhas ou até mesmo no meio-campo, quer no corredor central, quer nos meios-espaços, como o astro argentino faz na Catalunha. Assim, com Pizzi e Samaris, formariam quase sempre um triângulo que atrairia para si as atenções, mas manteriam o controlo da posse de bola, dando o tempo necessário para respirar e pensar o jogo ofensivo. Quanto ao Rafa, este deveria ficar com as missões de explorar o jogo nas costas da defesa de Moreira de Cónegos, os as alas quando nas transições. Pela sua velocidade e mobilidade, estou certo que criaria os espaços necessários para o triângulo Jonas-Pizzi- Samaris funcionar melhor, e não só. Também para aparecer o Carrillo.

Quanto a este, entendi a intenção da sua utilização à esquerda do nosso ataque. Tenho a certeza que o peruano é que não entendeu.  Mas, também tenho a certeza que outros colegas não entenderam, como o Rafa, que muitas vezes coabitava na sua zona. O camisola 15 foi colocado na esquerda para poder derivar um pouco para dentro e nesse movimento, ou combinar com os apoios interiores (Pizzi e Samaris, mas também Jonas se não tivesse ficado colado aos centrais), ou explorar as costas da defesa adversária com um passe para esse espaço que sobrevoasse a linha defensiva e fosse encontrar um Rafa, ou um Salvio ou até mesmo um Jonas nessa zona do terreno. A profundidade do flanco esquerdo seria concedida ao Eliseu, que subiu muitas vezes e que também este deveria ter sido servido mais vezes pelo peruano. Mas, não! Para Carrillo era ele, a bola e em último lugar o passe para o colega quando estivesse "à queima". Penso que já merecia um valente berro nos ouvidos, ou um puxão de orelhas, pois claramente, por si só não vai lá.

Mas, de todos estes posicionamentos, o pior deles todos e que acaba por dar cabo de todo um modelo mais pressionante e controlador, é o posicionamento do Jardel. Ele como líder da linha defensiva, não pode tomar durante todo o encontro uma postura de contenção. Enqunato a bola está na primeira fase de construção, é nomal que os defesas estejam bem espaçados entre si. Isso fará com que o adversário tenha de cobrir um maior espaço e isso cria espaços dentro da malha adversária. O problema é que quando a bola entra no nosso meio-campo, a linha defensiva tem de subir rapidamente para cobrir esse meio-campo. Ao fazer isso, se o médio-defensivo não ganha a segunda bola, tem de ser o central que lhe está a fazer a cobertura defensiva a ganhá-la. Ora Jardel, pela sua experiência sabe que tem de fazer isso. Mesmo que tenha receio de conseguir fazê-lo pois fisicamente não está no seu melhor. É que se for ele o primeiro a ir à bola, em vez de contenção, a cobertura do Jardel será feita por um central que estará melhor fisicamente. Na segunda parte, a equipa do Moreirense, soube bem aproveitar esta fraqueza do posicionamento e comportamento do Jardel. Foi aqui que esteve o ouro da vitória do Moreirense ontem à noite. E, isto era mais do que previsível, até porque, foi algo que deu muito nas vistas no encontro da semana passada para a Taça de Portugal frente ao Leixões, onde os dois golos leixonenses surgem do aproveitamento dessa debilidade.

Sem pernas e sem cabeça

É aqui, no exemplo do Jardel, que se realça a nossa incapacidade física. O central brasileiro está ainda sem ritmo de jogo, mas tem experiência suficiente para se proteger um pouco mais. O facto de não jogar não pode ser motivo para ser aceite a sua prestação ontem à noite. O Eliseu, que já não jogava há muito mais tempo que o brasileiro, apresentou-se bem melhor fisicamente. Aliás, neste contexto, também merece um puxão de orelhas o Carrillo, pois já tem tido minutos mais do que suficientes para ter outro tipo de resposta física mais energética, sobretudo, na reacção à perda da bola. E, sem estar bem fisicamente, a mente depois não funciona bem, pois o órgão do corpo que recebe mais sangue oxigenado (cerca de 1/5) é precisamente a mente (que pesa somente 1/50 de todo o corpo). Não estou a querer culpabilizar o Jardel, ou até mesmo o Carrillo. Contudo, já têm experiência suficientes para perceber o jogo e jogar acima de tudo com cabeça. Ao Jardel exigia-se maior concentração no seu posicionamento quando a nossa equipa tinha bola, isto porque, quando perdesse a bola seria facilitada a recuperação numa zona mais subida do terreno. Ou seja, não se correria tanto para trás (contenção) e assim não se cansaria tanto. Por sua vez, o Carrillo, se procurasse mais os apoios e mais o Eliseu, em vez de pensar logo em fintar um ou dois adversários, desgastando-se em correrias normalmente para o centro do terreno, metendo-se na "toca do lobo", conseguiria ter energia para ajudar o Eliseu e a sua defesa no corredor esquerdo. Com esta melhor utilização da energia dos jogadores, teria-se evitado muitos dissabores.

De qualquer maneira, tudo isto é recorrente e como tal, já deveriam estar avisados e preparados para estas situações. E, é isso que me preocupa. Desde o empate na Turquia que se tem notado esta incapacidade mental da equipa. Frente ao Boavista, sentimos que depois do golo do empate, se a equipa tivesse maior cabeça teria conseguido algo mais daquele jogo. Da mesma forma, ontem, se tivesse havido um pouco maior clarividência, após o golo do empate, teríamos estancado o jogo ofensivo do Moreirense. Por outro lado, o Rui Vitória também não mexeu muito bem no banco. a saída de Samaris quando Jardel já se arrastava em campo, não compreendi. Ainda para mais, quando nos minutos finais colocou o central a ponta-de-lança.