04 fevereiro 2017

Ideias interessantes...


... para a Luz!


Este artigo pretende ser um ensaio sobre a percepção errada que em Portugal se tem das competências e funções que um médio "8" tem de ter. Regra geral, pensamos num médio de transição, como um médio com capacidade de transporte, ou seja, os chamados "carregadores de piano". Temos tendência para aplaudir quem corre com a bola controlada pelo corredor central, mas esquecemos que isso ocorre na maioria das vezes porque há uma coisa chamada de espaço livre. O problema é que o comum do adepto não percebe esse conceito, mas tem essa visão desses jogadores a cavalgar metros com a bola controlada pelo centro do terreno. De tal forma, que exige que mesmo nas situações em que o tal espaço não existe, haja um jogador que faça isso. Ora insistir nisto é um acidente com data marcada para acontecer.

Vem esta estória à baila por causa da questão da possível ausência de Pizzi no meio-campo do Benfica. O internacional tem estado a fazer um excelente campeonato, sendo talvez a principal referência do Benfica neste momento. Por este motivo é com alguma apreensão que muitos adeptos estão com a forma como saiu do jogo do Bonfim, na passada 2ª feira. Com a chegada de Filipe Augusto no mercado de inverno, cedo os adeptos começaram a criticar esta contratação. Não apenas pelo nome e juventude, mas também pelas características do jogador. É aqui que entra a percepção que vos falava no parágrafo anterior. É verdade que embora o Filipe saiba transportar, é um jogador que pauta mais pela sua capacidade de passe e seu posicionamento. Mas, isto não significa que seja mau jogador para jogar na posição "8". Da mesma forma que eu tenho defendido aqui que o Samaris pode render muito bem nessa posição (e até como central).



De facto, isto não é apenas uma crença pessoal. É acima de tudo uma constatação da realidade. Uma realidade que transcende fronteiras nacionais e que implica uma abertura de espírito para olhar para novas ideias e entendê-las. É por isso que Leonardo Jardim tem evoluído muito na sua carreira. Outrora adepto confesso do 4-3-3, é hoje um dos treinadores que melhor trabalha o 4-4-2. O corredor central do seu quarteto de meio-campo, é formado basicamente por dois jogadores mais posicionais: Bakayoko e Fabinho. E, mais, o técnico madeirense não tem problema nenhum em deixar aquele que ainda é o melhor médio "8" em Portugal, o João Moutinho. Pelo menos, na forma como os portugueses vêem as características dos jogadores nesta posição. De forma idêntica, o Paulo Fonseca na época passada montava a sua dupla de meio-campo no Sporting de Braga, onde despontavam o Luiz Carlos e o Vukcevic, pelo menos depois da lesão de um tal de Filipe Augusto. Mas, porque razão estes treinadores preferem deixar o "8" como nós tão bem conhecemos para utilizar essas "espécies de oito"?

A razão é simples e acaba por ser bem demonstrada por Antonio Conte na Premier League inglesa, com a sua dupla de meio-campo formada por Kanté e Matic, dois jogadores de rigor defensivo e com enorme agressividade, que acabam por proteger as costas de criativos como o Hazard (percebem agora o título do "Jardim" do "Eden"?) e o Pedro. Mas, mais do que isso, eles acabam por ao não adiantar tanto com a bola nos pés, deixar essa tarefa para esses criativos. E, mais! Acabam por lhes dar o espaço necessário para esses criarem. O mesmo acontece na equipa do Mónaco. Não são raras as vezes que o Bernardo Silva sai da sua posição na ala direita e arranca com a bola controlada numa diagonal que o faz percorrer o corredor central e muitas vezes chega à ala direita, no encalço do passe certo no momento certo para o companheiro. Reparem no video acima com dois golos do Mónaco hoje frente ao Nice. Vejam bem como o espaço é criado. Vejam também como desta forma, se ele perde a bola, tem logo o Babayoko e o Fabinho para a recuperarem rapidamente. Isto acontece com o Hazard, assim como acontecia com o Rafa no Sporting de Braga. Portanto, com jogadores como o Samaris e o Filipe Augusto para o meio-campo e extremos como o Carrillo, o Rafa, o Zivkovic e o Cervi, não é difícil de perceber que esta solução poderá ser replicada nos relvados da Luz, se Rui Vitória estiver interessado. De qualquer maneira, fiquemos agora com a obra prima do belga do Chelsea, para amadurecer um pouco mais a ideia.



14 comentários:

  1. Não há uma tática vencedora. Cada uma tem as suas vantagens e desvantagens. Eu sou grande apaixonado pelo 4-3-3, mas não quer dizer que não ache a tatica do Conte de intrigante, ou o 4-4-2 do Jesus, demolidor com os jogadores certos.

    A questão que é preciso perceber no 4-4-2 do Vitória com ou sem transportador de jogo a 8, é que com um jogador como Witsel, Enzo e Renato- bons também na gestão dos tempos de jogo e no nível de passe-, poder-se-ia, sobretudo nos grandes jogos, transformar um momento ultra-defensivo, num contra-ataque letal. Com Pizzi isso nunca será possível, porque é jogador de tiki-takar a bola. Gosta de a sentir, de a fazer rodar, e de controlar os tempos de jogo.
    Voltando ao que disse no início, não há apenas um 8 vencedor, nem uma tática vencedora. Tudo é possível desde que se dê o devido enquadramento. Aí é que se estará a falha do Vitória em relação ao Pizzi. Não pode querer que os médios se juntem aos centrais para que a equipa fique mais compacta, com um jogador como Pizzi. É contra-senso. É o mesmo que pedir a um Xavi ou Iniesta que se juntem ao Fejsa para fechar qualquer espaço.
    Por outras palavras, ou se tenta assumir o jogo, pressionar alto, e tentar respirar no meio-campo adversário, ou então, joga-se com outro médio. Felipe Augusto ou o Pedro Rodrigues merecem oportunidade, pelo menos. Penso que o 1 será importante nos jogos grandes. É aqui que Vitória terá que ser corajoso e encontrar o equilíbrio certo entre a teoria e a prática.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Que obcessão é essa pelo Pêpê... ainda noutro dia vi o jogo dele e acho que ainda é muito curtinho para jogar na A. Mastiga demasiadas vezes as saídas para o ataque rápido, perdendo-se a oportunidade para a transição rápida... Ter toque de bola ele tem! Ter pinta também! Mas, falta-lhe maior conhecimento do jogo para atingir osutro nível. Conhecimento que se adquire com jogos nas pernas.

      Óbvio que não existe táctica perfeita... minto! Existe táctica, sistema e modelo de jogo perfeito para determinado conjunto de iogadores que um treinador tem à sua disposição. Ele é aquele que maximiza a cada momento as qualidades dos seus atletas e esconde ao mesmo tempo as suas debilidades.

      Sobre o Pizzi, por acaso não acho correcto a tua leitura. Estás a individualizar muito o problema no Pizzi quando ele até tem sido a solução. Deves olhar para o comportamento dos restantes jogadores da linha média e do ataque. Na maioria das vezes estes retiram o espaço ao Pizzi e pior não criam o espaço para ele, ficando muito estáticos posicionalmente.

      Pelo que tenho visto dos jogos, a bem da verdade, o Rui Vitória bem que está sempre a falar para dentro de campo com estes. Isto revela que ele está atento. E acredito que ele trabalha-os nos treinos. Acontece que isto são processos de aprendizagem que demoram um pouco.

      Eliminar
  2. Este post respira futebol por todos os poros. Muito bom.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Obrigado Kamikaze! A intenção é mesmo essa! 😉

      Eliminar
  3. Excelente texto, como de costume.

    E, quanto a mim, Pizzi nem é tanto um 8 de transporte...pelo menos em comparação com o Renato e o Enzo.

    No início desta época, estava fartinho de ler tantos benfiquistas na blogosfera repetir até à náusea o mantra 'falta-nos um 8!!' - num plantel com Pizzi, Horta, Samaris e Danilo...várias vezes insurgi-me contra este mantra, que obviamente tinha subjacente este preconceito sobre o 8 ter que ser de transporte, forçosamente...mas porque raio é que queimar linhas com um passe há-de ser pior que queimar linhas com o transporte de bola??!! Pelo contrário, na minha opinião, tendencialmente até é melhor: melhor gestão de esforço, logo mais discernimento para as decisões até ao fim do jogo, e melhor posicionamento em caso de perda de bola e transição defensiva...faltou-me na altura acrescentar este teu argumento de não 'roubar' espaço aos criativos da frente, em que de facto não tinha pensado até ler este post...

    Também um pouco por isto nunca embarquei muito na euforia com o Renato...a verdade é que ele, apesar de toda a raça, potência e mística, comprometia muito o equilíbrio táctico colectivo da equipa, tanto com maus posicionamentos sem bola (exemplo golo do Herrera na Luz, que quase nos tirava o campeonato...) como com arrancadas 'eu contra o mundo' quando o jogo pedia outras decisões...

    Quanto aos dois vídeos, quem não viu o Zivkovic e/ou o Rafa a fazer de Eden Hazard e/ou Bernardo Silva que atire a primeira pedra! ;)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Esses médios e transporte retiram muito esse espaço para este tipo de extremos que temos.

      Ontem estava a olhar para a equipa do Jardim e a ver este quarteto e dupla atacante: Bernardo Silva, Fabinho, Babayoko e Lemar, com Falcao e Germain lá na frente. Repara agora neste que poderíamos fazer cá: Zivkovic, Samaris, Fejsa e Cervi_; com Jonas e Mitroglou lá na frente.

      Aquele espaço entre linhas não é para ser ocupado por um jogador, pois isso faz com que o adversário tenha um jogador permanente naquela zona. O que interessa é atacar aquela zona com jogadores, de preferência da linha intermédia-avançada e dos nossos avançados, daí a preferência por Zivkovic e Jonas.

      Isto vai confundir o adversário, que mesmo tendo jogadores aí, vão ter que lidar com vários jogadores encarnados a virem de várias direcções, inclusive detrás deles (Jonas e até Mitroglou).

      Sobre o Renato, na época passada enquanto muitos elogiavam em exagero o rapaz, eu escrevi que perdemos o embate com o Bayern por culpa dele. Não dele de forma consciente ou porque ele não tem potencial para mais. Mas, por causa dele, porque ele tinha de crescer mais em termos de conhecimento de jogo. Ele tem a mentalidade competitiva certa e tem o coração no lugar certo. Falta-lhe pensar melhor o jogo. Em Munique e na Luz o Bayer chega ao golo, porque o Renato não soube recuperar bem e posicionar-se correctamente:

      http://o-guerreiro-da-luz.blogspot.pt/2016/04/por-falar-em-previsoes.html

      http://o-guerreiro-da-luz.blogspot.pt/2016/04/faltou-uma-pontinha-de.html

      Eliminar
    2. Ora nem mais! Só não decidi ainda entre Rafa e Cervi...

      Eliminar
    3. Benfiquista Primário, acabei de escrever um artigo sobre o jogo de hoje...

      ;)

      Eliminar
  4. o pizzi e bastante subvalorizado, assim como o fesja e isso ve se ate pelas equipas grandes nao mostrarem muito interesse neles,(fesja num arsenal era mais que perfeito imagina so a quantidade de criativos que libertavas) mas enquanto os adeptos ja veem a importancia do fesja pk sem ele a equipa sofre muito mais, o pizzi o pessoal nao ve que e ele que liga o jogo ofensivo do benfica todo e nao o cervi zivkovic e assim que desiquilibram mas na hora de construir ainda estao muito verdes. depois a posiçao estamos habituados a um tipo de jogadores e esquecem se que a mesmo posiçao pode ser feita por outros tipos (o patrick vieira era um 8, mas tb o iniesta e xavi jogavam la pelo barça, assim como o makelele e um 6 e o busquets tb e 6)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Sobre o Fejsa, não lhe dês ideias aos ingleses, pois se não estou em erro, Ederson, Lindelöf e Semedo já lá estarão na próxima época... (Mas sim! Cá para nós que ninguém nos oiça ou leia, o Fejsa tem lugar em qualquer meio-campo defensivo do mundo. Ele é um jogador de top mundial! Talvez o problema lá será mesmo a gestão física para aguentar 3 ou 4 jogos por semana... vê o modesto Hull do Marco Silva que jogou 8 jogos nos últimos 28 dias, ou seja, 1 jogo em cada 3 dias e meio.)

      Já quanto ao Pizzi, até acho que o pessoal reconhece o que ele faz com a bola nos pés (à excepção dos jogos em que ele falha muitos passes e a malta do "bota-abaixo" aparece sem perceber os motivos de tal quebra de performance). O que não reconhecem é o trabalho de "sapata" que ele faz todos os jogos... mas, isso também vejo fazerem com Xavi e Iniesta, portanto, enfim...

      ;)

      Eliminar
  5. Muito bom artigo.
    O problema é que neste momento a equipa está em d+efice na lateral esquerda e os alas revelam dificuldade em chegar à linha. Quando isso acontecer os dois médios "posicionais" podem ser uma excelente solução, garantindo uma segurança acrescida.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Verdade, sobre a lateral esquerda. Esse é um ponto que foquei aqui neste artigo, o qual convido-te a dares uma espreitadela:

      https://o-guerreiro-da-luz.blogspot.pt/2017/01/fara-sentido-continuarmos-jogar-com.html

      De qualquer forma, mesmo jogando com o Almeida a lateral esquerdo, temos de saber adaptarmos melhor ao que temos e, há muito espaço para melhorar isso. A ideia que referes é uma das formas de o fazê-lo, até porque libertaria mais o Cervi que está no corredor esquerdo.

      ;)

      Eliminar