21 fevereiro 2017

«De pequenino...


A velha questão da mentalidade vencedora.


Na origem do provérbio popular que serve de título a este artigo está o facto dos agricultores que cultivam os pepinos precisarem de dar a melhor forma a estas plantas. Para tal, retiram uns "olhinhos" para que os pepinos se desenvolvam, pois se não for feita esta pequena poda, os pepinos não crescem da melhor maneira, uma vez que criam uma rama sem valor e adquirem um gosto desagradável. Assim como é necessário dar a melhor forma aos pepinos, também é necessário moldar as crianças o mais cedo possível. E, quem diz crianças, diz jovens jogadores de futebol.

É aqui que se incute a mentalidade vencedora. Uma mentalidade que em vez de se amedrontar com o erro, saiba abraçá-lo. Mas, abraçá-lo não de forma a querer errar cada vez mais. Não é isso! Abraçá-lo sim, sabendo convivendo com ele e com a atitude que por cada erro que se comete uma nova oportunidade surge para redimir-se, porque tal como a vida, o jogo está cheio de oportunidades para darem o melhor deles próprios e com isso servir o melhor para a equipa atingir o objectivo do golo e no máximo a vitória final.

Para que isto aconteça, é necessário que haja um corpo técnico que entenda perfeitamente isto e que trabalhe os jogadores para ajudá-los a superar as adversidades que o próprio crescimento acarreta. A formação também serve para formar homens, pode parecer um chavão, ou até mesmo um cliché (talvez porque toda a gente diz isso e muitos poucos realmente o fazem), mas é bem real. Pelo menos no Benfica. E, isto é algo que define a nossa qualidade.



Este assunto vem à baila porque vejo isso nos nossos miúdos. Já não é a primeira vez esta temporada que a equipa comandada pelo João Tralhão (que realço e parabenizo pelo excelente trabalho neste escalão de formação do Benfica) consegue buscar a vitória na adversidade e na pressão psicológica. Talvez por isso, olho para o futebol nacional e antevejo grandes feitos, porque finalmente estão a formar como o agricultor trabalha os pepinos. Desprende os miúdos dos receios e fazem-los abraçar as oportunidades que o jogo lhes pode trazer.

Parece simples dizer e perceber isto, mas muito mais difícil é fazê-lo. E isso acontece aos melhores. O ex-capitão encarnado dos anos 80 e inícios de 90, o lateral direito António Veloso, foi um dos melhores e mais carismáticos da sua geração. Uma geração super talentosa com a bola nos pés, com algumas lacunas tácticas próprias do futebol daquela altura, mas com uma mentalidade "portuguesa". Ou seja, mentalidade que perante o estrangeiro se amedrontava, se encolhia, quase que com medo de desafiar os deuses. Era a mentalidade do quase. Era a mentalidade de "a culpa é do árbitro", ou "a culpa é da chuva", ou "a culpa é da neve",... quando na realidade a culpa é de não ter sabido dominar o erro, ficando a pensar nele vezes sem conta antes, durante e depois deste acontecer. Talvez por isso, e talvez por não ter tido uma formação como a actual, cedeu aos nervos e responsabilidade na final da Champions em 1988, ao falha o "penalti" decisivo (ver vídeo seguinte), precisamente com o PSV que os miúdos hoje defrontaram.

O que a formação do Seixal trás é descomplexar essas situações. O que ela ensina é tão simples como o seguinte discurso: «Erraste, ok! É porque não estás a dar o teu melhor e como o podes dar, poderás não voltar a repetir. Mas, não te preocupes que o jogo dará novas oportunidades para tu dares o teu melhor. Pelo que, quando ela aparecer, está preparado e força! Dá tudo!». Agora imaginem isto acontecer diariamente, treino após treino, situações diferentes em situações diferentes, palavras distintas em palavras distintas... Agora, imaginem todo um ambiente envolvente a falar da mesma forma, sem apontarem dedos quando falhas, mas a darem-te a mão quando isso acontece e a dizerem-te «'Bora! Vamos a eles! Juntos!»



E, a cereja no topo do bolo - tenho de dizer - é esta competição da UEFA. A Youth League é uma ideia fantástica do organismo que tutela o futebol europeu. Para mim, entre outras acções da UEFA, esta é daquelas que poderá contribuir enormemente para a manutenção da melhor qualidade do futebol praticado continuar no espaço europeu, pois é aquela que mais está consciente de que o próximo passo evolutivo desta modalidade é o do jogador inteligente. E, por inteligente não falo apenas a nível dos conceitos e princípios de jogo. Falo também de inteligência emocional, que é ainda mais do que saber lidar com pressão e erro. Mas, isso é outro tema. O que interessa referir é que esta competição acaba por dar oportunidade para estes jovens poderem experienciar outras realidades e estilos futebolísticos. Isto servirá como aprendizagem, fonte para recriarem, mas também para perceberem que não temos nada que ter medo ou receios de ninguém.

Hoje a equipa do Benfica venceu o PSV na marcação de grandes penalidades em Eindoven, para esta competição de "sub 19". O resultado no final dos 90 minutos era um empate a uma bola, com posterior vitória por 4 a 5 nos pontapés de grande penalidade. Embora não sendo exclusiva para jogadores sub 19, o Benfica basicamente alinhou só com jogadores com idade inferior aos 19 anos, ao contrário da maioria das restantes equipas que estão em prova. Por aqui verifica-se o grau de desenvolvimento da nossa formação e das metas de excelência que procuramos atingir.

Ah! E reparem no onze e nos suplentes escolhidos para este encontro por parte de Tralhão. Ele não repetiu o mesmo onze que defrontou os dinamarqueses no último encontro da fase de grupos. Podia tê-lo feito e, se calhar, era isso que um treinador em busca da vitória faria. Mas, aqui é que vem o principal objectivo da formação encarnada: formar jogadores! A maior vitória deste conjunto é chegar o mais longe possível com todos os miúdos. Não é apenas escolher os melhores daquela geração e jogar com eles. Neste caso até não seria sensato, porque muitos deles, como o Florentino jogaram no domingo. O que se quer é dar oportunidades a todos, até porque estão em idades em que um jogador que não dê nas vistas agora, poderá dar nas vistas amanhã. Veja-se o exemplo do Bernardo Silva, que nos iniciados e nos júniores era suplente e na equipa B, virou titular. Estou realmente muito contente com este trabalho. E, desejo ardentemente que estes miúdos consigam chegar o mais longe possível nesta competição. De preferência à final e que lá tragam a "orelhuda".



4 comentários:

  1. Parabéns pelo texto e pela análise. Relativamente ao Florentino não podia jogar mesmo. Recebeu duplo amarelo no jogo anterior.

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    1. Tens toda a razão yggdrasil!

      Mas, podia ter jogado o Pêpê e não jogou, porque a intenção deste projecto é proporcionar experiências aos jovens.

      Isto é muito à frente. Até para a realidade das melhores academias do mundo.

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  2. Não sei porque o PP não jogou, mas sei que os melhores (13 ao todo) foram poupados no jogo da equipa B, que por acaso ganhou na mesma.
    Portanto, para o Benfica é muito importante ganhar nesta competição, pois é uma excelente montra.
    Quanto às idades, jogámos com vários miúdos de 17 anos, e isso diz bem da qualidade destes meninos.
    Já agora, sabes quantos mais velhos que sub-19 podem alinhar, e quantos jogaram pelo PSV?

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    1. Ganhar é sempre importante, mas também é importante proporcionar experiências a todos os jogadores. Até porque é desta forma que os próprios técnicos vão percebendo quais os jogadores que têm o necessário para atingir outros patamares.

      Quanto aos jogadores mais velhos que sub 19, só podem inscrever até um máximo de 3 jogadores nesses módulos. Ver ponto 36.04 do seguinte documento:

      http://pt.uefa.com/MultimediaFiles/Download/Regulations/uefaorg/Regulations/02/35/94/51/2359451_DOWNLOAD.pdf

      ;)

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