14 setembro 2014

A Aposta


Com este artigo procuro levantar algumas questões e ensaiar algumas respostas sobre a temática dos jogadores que são apostas.


Talisca tem sido uma clara aposta de Jesus para o Benfica
versão 2014-2015.
A aposta: Talisca
O jovem brasileiro contratado este defeso tem sido uma clara aposta de Jorge Jesus para o Benfica versão 2014-2015. Não é por isso de estranhar que tenha sido titular em praticamente todos os jogos realizados pelo clube da Luz até ao momento (desde os encontros de pré-época até os jogos oficiais).

Durante os cerca de 15 encontros já disputados, o Talisca, nem sempre se apresentou da melhor maneira. Primeiro, foi testado em várias posições para tentar perceber a extensão da sua polivalência futebolística. Segundo, com o maior nível dos adversários, foi testado a sua vertente física e mental, a ver se conseguia elevar a intensidade do seu jogo. Terceiro, foi-lhe dando conhecimento e oportunidades atrás de oportunidades para errar. Tudo isto para culminar numa exibição de encher o olho no estádio do Bonfim em Setúbal, na passada sexta-feira.

Podemos questionar se frente ao Zenit, ele irá manter o nível. O mais provável é ele não conseguir, pois o nível da Liga dos Campeões é muito superior ao que ele encontra na liga Portuguesa. No entanto, será uma questão de tempo até ele atingir esse nível. Potencial ele tem e penso que ninguém dirá o contrário.


Porque é que o talentoso Nélson Oliveira não tem
as mesmas oportunidades?
A lição: Porque não fazer o mesmo com outros?
Este ensaio com o Talisca faz-nos pensar em porque é que outros jovens talentosos, não têm as mesmas oportunidades de serem apostas concretas. Não estou a defender aquele tipo de apostas como o André Gomes foi nas últimas temporadas, i.e., jogando 5, 10 e 15 minutos nos finais de encontros. Estou a falar deste tipo de aposta real, envolvidos num colectivo forte e experiente, capaz de absorver os defeitos dessas apostas, mas ao mesmo tempo de dar-lhe espaço para explanar as suas virtudes.

Por exemplo, faz-me confusão como o Jorge Jesus não apostou em Nélson Oliveira para a posição do Talisca. E, fico mesmo a perguntar-me se o jovem português tivesse tido a oportunidade de Talisca, se teria de esperar 15 jogos até vermos um resultado satisfatório... É que em termos técnicos, tácticos e físicos o português não fica nada a dever ao brasileiro, tendo inclusive várias vantagens. Uma delas é a sua experiência e intensidade do futebol europeu. Já agora, quando o Nélson surgiu no Benfica, teve uma oportunidade de jogar 15 jogos seguidos? Ou quem a teve foi o Rodrigo?

Relativamente ao Tiago (Bébé), Jorge Jesus poderá argumentar que chegou mais tarde ao grupo de trabalho e como tal leva esse atraso. No entanto, esperaria que o português fosse uma aposta mais segura neste momento, algo que não se confirmou.


A compreensão: Bernardo Silva
Compreendo quando à tempos o técnico encarnado falava o seguinte de Bernardo Silva e de Gonçalo Guedes:
«Valorizar um jogador não é só olhar para o que ele faz com a bola. Por isso é que sou treinador e vocês jornalistas. Precisam entender o conhecimento táctico e físico do jogo. Não podemos olhar para um menino só pela qualidade técnica. Precisa de etapas, de se desenvolver. Uns querem queimar etapas, outros não. O Bernardo preferiu sair para jogar, a estar no Benfica à espera do momento dele. Não podemos levar a mal, temos de aceitar»
Compreendo que aos olhos de Jorge Jesus, o Bernardo Silva possa ter a técnica necessária para jogar de águia ao peito, mas para jogar no seu onze possa não corresponder a nível físico, para as posições que ele possa entender que o jovem possa jogar. Daí entender, em parte, a preferência sobre o brasileiro.

Será que Bernardo Silva não poderia
também ser aposta clara na Luz?
O que não entendo, é porque é que Jesus não é flexível o suficiente para moldar as suas ideias de jogo ao que tem à sua disposição. Ou seja, "quem não tem cão, caça com gato". Por outras palavras, se não tem possibilidade de ter um Rodrigo, que fora vendido no defeso, mas tem jogadores talentosos como Djuricic e Bernardo Silva, para uma posição de "10" mais tradicional, porque é que não altera um pouco o seu modelo de jogo para incorporar estes dois talentos?

E, sobre a questão física dos jogadores, esta pode ser resolvida alterando o modelo de jogo da equipa. Um exemplo, bastante contemporâneo disso mesmo prende-se com o Barcelona de Guardiola e de Messi. Se formos a ver bem, essa equipa em termos físicos e nas bolas paradas era um fartote. No entanto, já está nos livros de futebol como uma das equipas que desde sempre melhor futebol praticaram. Ou seja, a questão física é importante, mas pode ser resolvida doutras formas. Aliás, o próprio Jesus já teve necessidade de alterar o seu modelo de jogo em vários jogos a nível europeu. Por exemplo, na época passada frente ao Olimpiacos, num jogo em que o Benfica teve uma enormíssima exibição, apesar da derrota.


Ola John é um belo exemplo de um jogador que é aposta
certa, mas que não consegue vingar-se na equipa.
As antíteses: Ola John e Felipe Menezes
Estes dois jogadores são dois bons exemplos de jogadores que foram contratados e foram inclusive apostas sérias - sobretudo o holandês à duas temporadas - e não resultaram/não estão a resultar. Eles estão aqui para salientar que mesmo que os nossos jovens sejam apostas e não consigam vingar-se, isso é normal, pois acontece exactamente o mesmo com muitas das nossas contratações. Sendo assim, porque é que continuamos a preferir o que vem de fora e não apostar no que já é nosso?

Muita gente argumenta esse tipo de questão, realçando o factor experiência. Mas, será mesmo correcto dizer que um jovem com menos de uma temporada completa como sénior numa equipa de um campeonato holandês ou de uma terceira divisão brasileira é mais experiente que jovens com uma ou duas temporadas completas nos escalões primários e secundários nacionais? Depende... e é esse factor demasiado subjectivo que os nossos ficam retidos. E também, é essa mesma subjectividade que permite esconder outro tipo de interesses que toda a gente sabe que gira à volta do futebol: muito dinheiro proveniente de prémios e comissões nas transferências.


Se calhar o problema não é apenas de "Jota-Jota"...
A posição: Jorge Jesus
Cada vez mais penso nestas questões e na postura de Jorge Jesus, mais o admiro. Admiro, porque é sobre ele que todos os interesses acabam por ter que ser resolvidos. É o treinador encarnado, quem deverá responder às reais necessidades da equipa. É ele quem deve responder aos interesses dos próprios atletas. E, é ele que deve tentar conciliar tudo isto com os interesses da direcção e da tribo futebolística que gira à sua volta.

Entendo, perfeitamente, porque é que Jesus prefira um jogador com perfil técnico, táctico e físico que se enquadra que nem uma luva no seu onze, em vez de outro jogador com um potencial tremendo, mas que para o encaixar na equipa tenha de mudá-la. Na verdade, Jesus sabe que o processo de construção de uma equipa é demoroso e em alta competição, com a urgência de resultados positivos/vitórias, ter tempo é um luxo que os treinadores não podem pensar em tê-lo.

Por outro lado, Jorge Jesus tem de ter noção do negócio. Não é à toa que após a grande exibição que Talisca efectuou em Setúbal saiu-se com «daqui a alguns anos vai render uns milhões». É por ter que responder à direcção nesse nível que as suas opções são igualmente restringidas. Por exemplo, ninguém tira-me da cabeça que a insistência em Ola John é também muito por causa do investimento avultado no holandês, por parte da direcção e dos fundos com quem esta trabalha.


Só estes três poderão mudar o paradigma futebolístico
do Benfica. Está nos seus poderes o fazerem.
A solução: Mudança de paradigma
Só com uma mudança de paradigma desportivo/empresarial é que Jesus poderá ter outro tipo de comportamento nas suas apostas. Da mesma forma, como a direcção o restringe de determinada forma, para ele apostar em determinados jogadores, esta mesma direcção se quiser poderá fazê-lo tomar certo tipo de opções.

Não estou com isso obrigá-lo a usar todos os miúdos da nossa formação. Estou sim a escrever que poderá ser a direcção a obrigar o Jesus apostar nos melhores da nossa formação e sobre eles construir a equipa.

É que senão, vamos continuar a desperdiçar talento, talento esse que valorizado no Benfica poderá render vários milhões de lucro a custo 0 (assim como permitirá que a nossa selecção nacional volte a ter jogadores de qualidade e experimentados, capazes de grandes feitos internacionais e que como tal consigam encher os cofres da federação para esta reciprocamente apostar em melhores condições da prática futebolística no nosso país).

2 comentários:

  1. Jorge Jesus não aposta nos jogadores oriundos da formação e como tem tido resultados positivos ninguém lhe impõe essa aposta.É um caminho errado mas com ele não há outro.Felizmente tem outras qualidades.

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    1. Não acredito que seja contra os jovens em si. Acredito que o perfil futebolístico da maioria desses jovens que vêm da formação não se enquadram no perfil que pretende para cada posição (caso de Bernardo Silva e João Teixeira), ou que lhes falta experiência e outro traquejo profissional que outros já têm (Cancelo e Cavaleiro).

      Esta é uma interpretação. Mas, tal como escrevi no texto acima, ele também poderia ser mais flexível, mas se não foi com Djuricic e até o próprio Ola John, porque haveria de ser com os "nossos"?!

      Repara que falei do sérvio e do holandês, porque penso que ambos poderiam ter sucesso no Benfica se o sistema de jogo da equipa mudasse um pouco para aproveitar as características destes dois. Por exemplo, Ola John precisa de um meio-campo que seja capaz de dar-lhe liberdade ofensiva e menos preocupações defensivas, algo que no 4-4-2 de Jesus tal é impensável. Por outro lado, o Djuricic precisa de jogar de trás para a frente e não de costas para a baliza, algo que no duo atacante não consegue fazê-lo...

      De qualquer forma, penso que há interesses externos que prevalecem de forma mais vincada que os supostos racionais, como são os do aproveitar o que melhor se forma no Seixal.

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