25 junho 2017

Os Jogos de Poder...


Uma entrevista que diz muito...



... sobre o futebol nacional e sobre os seus jogos de poder. Talvez por isso, até acabe por contextualizar ainda mais o actual clima que se vive em volta do futebol nacional, onde certos clubes perderam poder e com isso se sentem ameaçados. E, pior, pensam que perderam poder para outros, quando na realidade são as próprias instâncias que tendem a profissionalizarem-se. Mas, reparem como as coisas aconteciam há uns tempos atrás e, como querem que continue a acontecer...

Mas se era adjunto no Estoril e já treinava seniores, porque decidiu voltar à formação?A formação só servia de trampolim, para dar o salto para os seniores, e eu também queria isso: ser treinador principal de um clube. Só que... Fui convidado pelo José Augusto para trabalhar na Federação — ele era o lado prático, eu era o lado académico. O Jesualdo Ferreira também me tentou convencer. Eu já estava no futebol profissional e aquilo representava voltar para trás; mas fui convencido. E fiquei por lá 10 anos.
E o que encontrou?Era tudo muito rudimentar e o Carlos Queiroz criou uma aberração chamada “Departamento Técnico de Futebol” [ironia]. A FPF tinha tudo menos uma coisa — o futebol, que era um departamento subsidiário do departamento financeiro, jurídico, etc. Não havia ninguém dedicado a pensar no futebol. Quando falei nisso, houve gente a dizer: “Então, mas agora vamos ter duas federações aqui dentro? Este gajo quer é mandar nisto.” Eu só queria ter autonomia para gerir, pensar e planear o futebol. Estava tudo acomodado e agarrado a lugares, e eu mexi com isso. Há um episódio curioso que tem a ver com o projeto de reestruturação do futebol português que eu apresentei. Um dos pontos era sobre a redução do número de equipas que iriam disputar a primeira divisão. Entrevistei todos os presidentes dos clubes — Pimenta Machado, Pinto da Costa incluídos — e a maioria concordou com a redução. Tenho os documentos que provam o que eles diziam: “Mais de 14 é uma loucura para um país como o nosso.” Alguns dos que concordaram com isso nas entrevistas privadas foram os primeiros que se puseram contra mim publicamente.
Porquê?Porque a redução do número de clubes implica uma redução do número de votos por associação nas assembleias gerais, provocando um desequilíbrio no jogo de poderes. E havia muitos jogos de poderes e de interesses. Por exemplo: estava nos estatutos da FPF que a associação maioritária indicava o nome do presidente da Federação. Durante anos, de uma forma generosa e simpática, a associação mais representada [a do Porto] dizia: “Somos tão amigos, vocês de Lisboa que escolham o presidente, sim?” Porquê? Porque a segunda figura a ser escolhida era o presidente da arbitragem. [silêncio] Depois os de Lisboa falavam em “bandidos” e em “sistema?” E eu, treinadorzinho, assistia àquilo tudo e fazia perguntas incómodas.
Mas não correram consigo da FPF.Porque eu andava a ganhar. Vencemos o Mundial de Riade e o Mundial de Lisboa e eu era como que um super-homem, um super-herói para o país. Até as minhas imbecilidades passavam — qualquer treinador, se estiver numa dinâmica de vitória, pode dizer o que quiser e nada lhe acontece. O Salvador, o cantor, tem agora seis meses para falar o que quiser — e ele até diz coisas bonitas — e eventualmente cair em imbecilidades, que ninguém o vai criticar. O meu azar foi não me ter qualificado para o Mundial de 1994, na derrota com a Itália. Só que, mesmo aí, houve um terramoto.

por Carlos Queiroz em Tribuna Expresso

4 comentários:

  1. e será que mudou assim tanto? por exemplo, o pessoal fala das coisas da justiça e afins no caso dos e-mails, mas se no apito dourado e do cristovao ambos grandes fugiram á despromoçao, como saberemos que as implicancias da justiça seram justas ?

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    1. É por isso mesmo que escrevi este artigo. Para que os adeptos encarnados percebam o contexto em que vivemos.

      ;)

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  2. E o dopping do Liedson, onde está na entrevista?

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    1. Tens o link no final "Tribuna Expresso" ;)

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