03 junho 2016

Canela até ao pescoço


Um olhar sobre o futebol da selecção nacional, nomeadamente o jogo frente a Inglaterra.

O "gesto técnico defensivo"  - como o Jorge Jesus ontem comentava - do Bruno Alves é tão grave como a sua convocatória para o Euro 2016 em França. Se dúvidas restassem, ontem todo o português viu o quanto não faz falta à selecção nacional. O Bruno até pode ser daqueles jogadores que faz um excelente balneário - o palhaço do grupo - mas, ser um bom rapaz não é tudo. Ainda para mais, quando há lá muitos outros com essa capacidade. A avaliação tem de ser feita com o que faz em campo. E, nesse campo, o camisola 2 das quinas, tem estado muito a desejar. Desde que saiu do Porto a sua carreira tem vindo sempre a descer. Na Turquia, numa equipa de milhões, dirigida por um treinador bicampeão nacional, o Vítor Pereira, não conseguiu ser campeão e não tem estado muito bem. A velocidade desapareceu, a intensidade que tinha também. Hoje é um central lento e com um poder de reacção lento. Tecnicamente, até pode ganhar os torneios de futvólei nas tardes de churrasco na sua casa, mas assumir a construção de jogo... está quieto! Tacticamente, poderia compensar a sua menor frescura física com maior inteligência de jogo e não é isso que vemos. Basicamente, neste momento, ele pensa que sendo agressivo pode intimidar os adversários e superiorizar-se nos duelos. Esquece-se que ele não está a jogar contra meninos, mas sim contra jogadores como Kane, Vardy e Rooney. Aliás, basta perceber que se o árbitro não tivesse apitado na falta do Bruno Alves, o Kane teria seguido o jogo, mesmo depois da agressão grotesca. Já agora, que diferença de mentalidades, não é verdade?  O que é certo é que a expulsão de Bruno Alves acabou por sabotar por completo o que Fernando Santos tinha preparado para este encontro.

De qualquer maneira, há algumas coisas que penso que são importantes referir. Em primeiro lugar, Adrien e Moutinho no mesmo onze, não funciona. Pelo menos esta é a minha visão com base no que vi antes de de ficarem reduzidos a 10 jogadores e depois. Não raramente, vi ambos a irem para os mesmos espaços e atropelando um ao outro nas suas funções. Mas, se tivesse que escolher apenas um dos dois para desempenhar a função, neste momento, escolhia o Adrien. O João Moutinho está uma miragem em termos físicos do jogador que foi no passado recente. Claramente é um jogador em busca da melhor forma física. E, isto viu-se bem no jogo frente à Noruega.

Quanto à dupla Rafa e Nani, pessoalmente não gostei. O nível era elevado é certo. Estavam a jogar pela primeira vez neste modelo, também é uma verdade. Mas, há coisas que se tem ou não se tem: química entre dupla. São dois jogadores que estão habituados a transportarem a bola de trás para a frente e por terem uma relação muito mais especial com a bola, descuram um pouco a relação com o jogo, sobretudo em espaços que não estão habituados a jogar. Eles não precisam de saber jogar de costas para a baliza, como um ponta-de-lança de referência que seja mais fixo (tipo Mitroglou). Eles precisam sobretudo adaptarem-se as suas formas de jogar às zonas em que vão jogar. Nesse contexto, senti que tanto Nani como o Rafa têm muito que trabalhar. O maior receio é verificar se essa adaptação seja longa. O Rafa está habituado a pegar no jogo a meio-campo/entre-linhas, mas numa zona lateral esquerda derivando para o centro. O mesmo para o Nani, embora jogue muitas vezes pelo corredor direito. Dificilmente, vejo o Nani como o avançado que substituirá o Ronaldo. Por outro lado, dificilmente vejo este Rafa a conseguir fazer de segundo avançado, depois da temporada a jogar numa posição onde parece estar como peixe na água. Ou seja, como falso médio-ala/extremo esquerdo, ainda para mais tendo a competição de Nani e de Ricardo Quaresma para a posição. O "mustang" está talvez na sua melhor forma e a meu ver, neste momento, é ele e mais 10 na selecção nacional. O Nani que se cuide! Pois, o principal candidato a acompanhar Cristiano Ronaldo no ataque das quinas é o Quaresma.

Por tudo isto, penso que o grupo pode ser separado em dois modelos de jogo um pouco distinto entre eles, devido a apostarem em dois sistemas um pouco distintos: o 4-4-2 losango (variante 4-1-2-1-2 com losango interno) e o 4-3-3 mais tradicional. Ou seja, em 4-1-3-2, vejo o seguinte onze titular: Rui Patrício; Vieirinha, Pepe, Ricardo Carvalho, Eliseu; William Carvalho; João Mário, Adrien, André Gomes; Quaresma e Ronaldo. Já em 4-3-3 vejo o seguinte onze: Anthony Lopes/Eduardo; Cédric, José Fonte, Bruno Alves, Raphäel Guerreiro; João Moutinho, Danilo Pereira, Renato Sanches; Nani, Éder e Rafa. Um onze mais ofensivo, será baseado no sistema de 4-4-2, mais aberto e ofensivo, modificando um pouco o modelo de jogo, pois exige maior posse de bola. Seria então composto por: Rui Patrício; Vieirinha, Pepe, Danilo Pereira e Raphäel Guerreiro; Quaresma, João Mário, André Gomes e Rafa; Nani e Cristiano Ronaldo. Seria um onze para jogar sobre o meio-campo adversário, com enorme qualidade técnica, muita mobilidade e, por isso mesmo, muita imprevisibilidade. Contudo, pelo que estou a ver, não acredito que faça isto. São alterações a mais na cabeça de Fernando Santos, dado ao facto deste estar a querer proteger um pouco o trabalho de continuidade feito até então. Por exemplo, não estou a ver o seleccionador a preterir de João Moutinho ou de William Carvalho no centro do meio-campo. Para mim, João Mário e André Gomes teoricamente conseguem ser mais jogadores nessa posição central, pois ambos sabem jogar com e sem bola e têm ambos índices de trabalho muito elevados. Caso o Fernando Santos, queira apenas trabalhar um modelo mais rígido, as opções para as posições não deverão ser muito diferentes destas: para guarda-redes, Rui Patrício, Anthony Lopes e Eduardo; para lateral direito, tem-se Vieirinha e Cédric; para central do lado direito, tem-se Pepe e José Fonte; para central do lado esquerdo, as opções são Ricardo Carvalho e Bruno Alves; para lateral esquerdo, tem-se Eliseu e Raphäel Guerreiro; para médio defensivo, tem-se William Carvalho e Danilo Pereira; para interior direito, as opções são João Mário e Renato Sanches; para interior esquerdo, as opções são André Gomes e Rafa; para médio todo-o-terreno, as opções são Adrien e João Moutinho; para avançado móvel, temos o Quaresma e o Nani; enquanto para avançado centro, tem-se o Cristiano Ronaldo e o Éder. Escusado será dizer que aquele trio de jogadores do meio-campo em frente ao médio-defensivo pode funcionar como carrossel, podendo todos eles ir mudando de posição ao longo da partida, criando assim uma dinâmica de jogo que pode beneficiar a selecção nacional. Aliás, recordar que foi Fernando Santos quem trouxe este tipo de modelo de jogo, aquando da sua passagem pelo Benfica (e pelo Sporting, se bem que não teve tempo para o consolidar e foi Paulo Bento que o fez).

Por falar no seleccionador, fiquei um pouco descontente com a abordagem que ele teve após a expulsão de Bruno Alves. Tendo Danilo Pereira, João Moutinho e Adrien em campo, porquê fazer entrar um central para jogar ao lado de Ricardo Carvalho? Porque não apenas fazer descer o Danilo para a posição de central e dar o corredor central a Adrien e João Moutinho. Aliás, penso que dada a forma do Moutinho, seria indicado deixá-lo numa função mais posicional, dando as despesas de médio todo-o-terreno para o Adrien. Ambos até poderiam ir alternando funções durante o resto do jogo para poderem gerir esforço físico se fosse necessário. A vantagem disso, é que a selecção não perderia tanto a conexão entre meio-campo e ataque. Pessoalmente, penso mesmo que a expulsão de Bruno Alves teria sido vantajoso para jogadores como João Moutinho e Rafa Silva. Este último, poderia pisar terrenos mais recuados e disparar em transporte para o ataque, podendo combinar de melhor forma com Nani, que entretanto procuraria não estar tanto entre os centrais como esteve quando estávamos onze contra onze. Ao entrar José Fonte, basicamente Fernando Santos ancorou a equipa lá atrás. A saída de bola da defesa continuava a ser péssima, com falta de qualidade e lenta, por isso é que a selecção inglesa dava-se ao luxo de nem pressionar. Ao fazer isso, atraía o "dez" das quinas a avançar a sua linha defensiva e não tendo a arte e engenho para desequilibrar (princípio de fixar e passar), fazia com que a organização defensiva inglesa recuperasse a bola. Ora esta não chegando em qualidade aos nossos médios fazia com que entrássemos logo em momento de transição defensiva, provocando desgaste. Para além disso, essa subida inicial no terreno permitiria aos ingleses aproveitarem esse espaço nas costas, através da dupla de avançados como Vardy e Kane, fazendo bom uso da visão e capacidade de passe de Wayne Rooney.

Achei engraçado à fanfarronice de Jorge Jesus que comentou o jogo na televisão. Criticou imenso a criatividade dos jogadores ingleses. No entanto, sobre a forma como o nosso meio-campo jogou antes e depois da expulsão do Bruno Alves, estava a ser benevolente. Ou seja, não soube ser imparcial. Nem tão pouco soube efectuar críticas positivas. A forma como ele criticou a pressão dos ingleses então é outro tema que enfim... Se nós estamos a ensaiar um novo modelo e sistema de jogo, usando estes jogos de preparação para afinar isso mesmo, porque é que os ingleses não podem estar a fazer o mesmo? Porquê armarmos-nos em campeões e dizermos logos que somos melhores que eles porque não conseguem ver e fazer? Se calhar, não o fazem, porque estão a fazer as coisas como método. Por exemplo, assim como seria uma boa estratégia os avançados ingleses e toda a equipa inglesa pressionar bem alto à saída de bola nacional, também é uma boa estratégia deixar a linha defensiva de Portugal subir e como os centrais não são tão bons a construir atraí-los para uma armadilha em que façam um mau passe de tal maneira que possam lançar o contra-ataque rapidamente. Em termos de metodologia de treino, é mais fácil treinar esta última estratégia que a primeira. Se há equipas que mesmo depois de uma temporada não conseguem fazer pressão, quanto mais uma equipa que foi constituída à pouco mais de uma semana... O mesmo que escrevo para os ingleses, escrevo para os portugueses. Achei apenas importante mencionar isso, devido aos elogios que li e ouvi nos últimos dias a alguns comentários do Jota-Jota.

Os três esquemas e onzes que penso melhor adequam
ao grupo de trabalho e às ideias que Fernando Santos
possa ter em mente.

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